quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Enterro da Otta

Exatamente oito meses. Foi esse o tempo que precisamos para conseguir fazer o enterro da Otta. A sua vida, apesar de muito introspectiva, foi bem longa. Ninguém podia imaginar que iria passar ainda tanto tempo entre nós. Parecia que estava lá “só ocupando espaço”. Só saquei que ocupar esse espaço tinha um propósito quando vi a terra enchendo a sua cova. Senti que a Otta fazia mesmo parte da fase mais marcante da minha vida.

Não foi por acaso que precisei deixar ela congelada por longos oito meses. Foi quase o mesmo tempo que passou viva dentro de mim. Nesse período ela se comportou bem, mas claro, deixou o Rodrigo com vergonha. Ele ficou branco quando um amigo abriu o congelador para pegar gelo e perguntou o que era aquilo. Bastou um olhar fulminante. Fiquei bem quietinha.

Foi enterrada em grande estilo. A cova, preparada há quatro meses, debaixo do pé de pitanga na entrada da nossa casinha, ganhou do Rô florzinhas e uma limpeza geral. Depois que o vigia da rua viu o buraco e se ofereceu para plantar, foi a vez do vizinho aparecer bem na hora do enterro. Aí o Otto entrou em ação para garantir a privacidade da sua companheira. Quando o simpático vizinho começou a se aproximar, o Otto esfregou pelo rosto a ameixa amassada que estava na sua mão. O vizinho deu dois passos para trás e preferiu brincar de longe.

O Otto comemorou, bateu palmas e jogou folhinhas de lavanda na cova. O Rô ainda não acreditava no que estava acontecendo e falava: “E eu que achava o Tom Cruise estranho...”.

Enfim, não foi à toa que a Otta ficou tanto tempo com a gente. Hoje acordei com a sensação que acabou a fase "grávida" ou "mãe de recém-nascido". Hoje acordei com a certeza de que sou uma mãe completa, pronta. A Otta cumpriu muito bem o seu papel dentro da barriga e do congelador.

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